Os efeitos nocivos do consumo excessivo de açúcares em diversos desfechos, incluindo distúrbios cardiometabólicos, já foram amplamente estudados, sendo reconhecidos como fatores de risco pelas autoridades de saúde pública. Particularmente, a OMS recomenda que menos de 5% do consumo calórico diário deve ser proveniente de açúcar livre. Os adoçantes artificiais surgiram como uma alternativa, permitindo que o sabor fosse reproduzido sem o uso de açúcar, reduzindo o total calórico diário. Um grande número de produtos contém esses aditivos alimentares, especialmente alimentos ultraprocessados, bebidas adoçadas artificialmente, além de lanches e refeições prontas de baixa caloria. Mas afinal, o uso dos adoçantes é saudável?
Estudos com diferentes desenhos investigaram marcadores de saúde cardiovascular, como peso, hipertensão, inflamação, disfunção vascular ou mesmo alterações da microbiota intestinal em associação com o consumo de adoçantes. A maioria desses sugeriu efeitos adversos, com poucos sugerindo propriedades neutras ou benéficas. O relatório da OMS de 2022 sobre os efeitos na saúde dos adoçantes artificiais observou associações entre o consumo de adoçantes e alguns marcadores de DCV, incluindo um pior perfil lipídico e risco aumentado de hipertensão.
Nesse contexto, foi publicado um grande estudo de coorte populacional no British Medical Journal. Participaram 103 388 franceses (idade média 42,2±14,4, 79,8% do sexo feminino). A ingestão de adoçante foi associada ao aumento do risco de doenças cardiovasculares (RR 1,09, IC 95% 1,01 a 1,18, P=0,03) e de doença cerebrovascular (RR 1,18, P = 0,002). Aspartame, acessulfame de potássio e sucralose foram associados com aumento de risco de doença cerebrovascular e coronariana. Os resultados sugerem que os adoçantes artificiais podem representar um fator de risco modificável para a prevenção de doenças cardiovasculares. Esses aditivos alimentares, portanto, não deveriam ser considerados uma alternativa “saudável” ao açúcar.
O estudo, contudo, apresenta uma série de limitações. Apesar do ajuste para diversos confundidores, trata-se de um estudo populacional, não randomizado, com resultados que apresentam o potencial de gerar hipóteses, não conclusões. O maior uso de adoçantes poderia estar associado a maior IMC inicial (mais pacientes no grupo de maior uso tentaram perder peso durante o estudo, por exemplo). Além disso, grande percentual dos pacientes foi formado por mulheres francesas com elevada escolaridade, o que limita a generalização dos resultados. Ensaios controlados randomizados não avaliaram diretamente o impacto dos adoçantes artificiais em desfechos rígidos, como risco de DCV. Dados prospectivos permanecem limitados e o nível de evidência para essas associações ainda é considerado baixo.
De fato, diversos mecanismos podem ser implicados na associação do consumo de adoçantes e maior risco cardiovascular. Entretanto, estudos mais robustos, com desenho adequado, são necessários para finalmente esclarecer se a substituição do açúcar pelos adoçantes artificiais é realmente uma alternativa saudável.