A associação entre diabetes e aumento do risco de fratura de fragilidade já é bem definida na literatura tanto em relação ao diabetes mellitus tipo 1 (DM1) quando tipo 2 (DM2). No caso do DM1, sabemos que os indivíduos acometidos apresentam mais frequentemente baixa massa óssea para a idade avaliada pela densitometria óssea (DXA) quando comparados com a população geral. Já no DM2, a avaliação pela DXA é mais problemática, uma vez que os indivíduos acometidos apresentam massa óssea igual ou até mesmo superior à população geral, mesmo que o risco de fratura de fragilidade seja bem mais alto.
O risco de fratura nestes pacientes aumenta consideravelmente com o tempo de doença, especialmente após 10 anos do diagnóstico de DM2 e após 26 anos do diagnóstico de DM1. Acredita-se que parte deste efeito seja decorrente dos danos micro e macrovasculares que também afetam o tecido ósseo. Não à toa, indivíduos com complicações microvasculares e com doença cardiovascular parecem ter maior risco de fratura.
Levando isso em consideração, a ADA incluiu recomendações específicas referentes à saúde óssea do paciente com diabetes em sua diretriz de 2024. Enquanto, em anos anteriores, apenas um parágrafo era dedicado a discutir este tema, desta vez temos um tópico inteiro sobre saúde óssea dentro do capítulo Comprehensive Medical Evaluation and Assessment of Comorbidities. E quais as recomendações definidas pelos autores?
- O risco de fratura deve ser avaliado em idosos com diabetes como parte dos cuidados de rotina na prática clínica, de acordo com fatores de risco e comorbidades.
Os autores consideram os fatores de risco clássicos para fratura de fragilidade: fratura de fragilidade prévia; idade > 65 anos; baixo IMC; sexo feminino; má absorção intestinal; quedas frequentes; uso de glicocorticoides; história familiar; abuso de álcool; tabagismo; e artrite reumatoide.
Mas cita também fatores de risco que seriam específicos do diabetes: T-escore em L1L4 ou quadril -2.0; hipoglicemia frequente; duração do diabetes > 10 anos; uso de insulina, tiazolinedionas ou sulfonilureia; HbA1c > 8; neuropatia periférica; neuropatia autonômica; retinopatia e nefropatia.
Em relação à avaliação do risco pelo FRAX, sabemos que a maior limitação é o fato da calculadora ainda não incluir o DM2 como fator de risco (na presença de DM1, podemos marcar “sim” para osteoporose secundária). Os autores citam, no texto, a possibilidade de ajustar o risco calculado pelo FRAX aumentando a idade em 10 anos, reduzindo o T-escore do colo do fêmur em 0,5 ou marcando “sim” para artrite reumatoide.
Outra possibilidade é utilizar o TBS para ajustar o risco calculado em pacientes com DM2. Em relação ao DM1, os autores lembram que não há evidências ainda para utilizar este ajuste.
- Deve-se monitorar a densidade mineral óssea através da DXA em idosos de alto risco com diabetes (idade >65 anos) e em mais jovens com múltiplos fatores de risco a cada 2-3 anos.
Em pessoas com diabetes tipo 2, na ausência de outras comorbidades, DXA deve ser realizada pelo menos 5 anos após o diagnóstico de diabetes e a reavaliação é recomendada a cada 2–3 anos dependendo do resultado densitométrico inicial e da presença de fatores de risco adicionais.
No caso do DM1, deve-se considerar a triagem com DXA após os 50 anos de idade, já que é a partir desta idade que o risco de fratura de quadril começa a aumentar nesta população. Em pacientes jovens com DM1, o momento ideal para se realizar a DXA ainda é controverso e, portanto, não há uma recomendação oficial. Embora sua solicitação deva ser considerada na presença de doença celíaca associada.
- Deve-se considerar o potencial impacto adverso na saúde óssea ao selecionar opções farmacológicas para reduzir os níveis de glicose nas pessoas com diabetes. Deve-se priorizar medicamentos com perfil de segurança comprovado para a saúde óssea, especialmente para aqueles pacientes com risco elevado de fraturas.
- Para reduzir o risco de quedas e fraturas, o alvo glicêmico deve ser individualizado em pessoas com diabetes e alto risco de fratura. Priorizar o uso de medicamentos hipoglicemiantes associados ao baixo risco de hipoglicemia para evitar quedas.
Metformina, inibidores de DDP-IV e análogos de GLP1 são consideradas medicações seguras para a saúde óssea. E tirzepatida parece ter um efeito positivo, já que o agonismo do GIP previne a perda de massa óssea que pode acompanhar a perda de peso.
Embora os resultados do CANVAS com a canagliflozina tenham acendido um alerta em relação ao efeito dos inibidores de SGLT2 sobre a saúde óssea, dados com dapagliflozina e empagliflozina não demonstraram impacto negativo sobre o osso.
Já em relação à pioglitazona, deve ser evitada em pacientes com alto risco de fratura. As sulfonilureias, por aumentaram o risco de hipoglicemia e quedas, também não são boas opções em indivíduos de alto risco.
Também considerando o risco de hipoglicemia, a insulina está associada ao dobro do risco de fratura de quadril. Mas há também que considerar que aqueles em uso de insulina costumam ter maior tempo de diabetes e mais comorbidades o que, por si só, já aumentaria este risco.
De qualquer modo, é preciso evitar terapia intensiva em idosos mais frágeis, com o objetivo de evitar hipoglicemia e quedas. E, especialmente em idosos e naqueles com maior tempo de doença e com mais complicações, devemos preferir hipoglicemiantes orais com um bom perfil de segurança para a saúde óssea.
- Deve-se orientar os pacientes com diabetes sobre sua ingestão de cálcio e vitamina D para garantir que se atenda às recomendações diárias para aqueles em risco de fratura, seja por meio de sua dieta ou meios suplementares.
Todos os pacientes com diabetes devem ser orientados a manter ingestão adequada de proteínas, cálcio e vitamina D; a cessar tabagismo; e a manter atividade física regular.
Os autores citam que os níveis ideais de 25-hidroxivitamina D em pacientes com diabetes é controverso. E que, embora níveis 20 ng/ml sejam geralmente suficientes, alguns guidelines sugerem níveis acima de 30 ng/ml.
- Medicamentos antirreabsortivos e agentes osteoanabólicos devem ser considerados para pessoas com diabetes que têm baixa densidade mineral óssea com T-escore -2,0 ou já experimentou fraturas por fragilidade.
Um ajuste de -0.5 no T-escore de indivíduos com DM2 tem sido proposto para melhorar a predição de risco de fraturas através da DXA. Desta forma, um T-escore de -2.0 deve ser considerado equivalente a -2.5. Desta forma, os autores da diretriz entendem que já deve ser indicado tratamento para osteoporose.
Obviamente, naqueles com osteopenia, sem fratura e T-escore acima de -2.0, devemos continuar calculando o FRAX para decidir sobre o tratamento.
Esta última recomendação é, sem dúvida, a mais relevante em relação a este capítulo da nova diretriz da ADA, uma vez que ratifica uma conduta já sugerida por alguns autores, tendo impacto direto sobre as condutas na prática clínica.