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Alarme falso: jejum intermitente não aumenta o risco de morte cardiovascular

Escrito por Ícaro Sampaio

O jejum intermitente ganhou popularidade como opção de intervenção dietética que limita o consumo diário de alimentos a um período – janela alimentar – de 4 a 12 horas. No mês de março uma manchete ganhou destaque na imprensa: “jejum intermitente aumenta o risco de morte de causa cardiovascular”. Certamente, a maioria de vocês e boa parte dos seus pacientes se deparou com essa notícia nas últimas semanas. No entanto, é preciso entender qual foi o fato e todo o sensacionalismo criado em torno dele.

Bem, qual foi o fato? Tudo começou com uma pesquisa apresentada no formato “pôster” na conferência American Heart Association’s Epidemiology and Prevention│Lifestyle and Cardiometabolic Scientific Sessions, que ocorreu em Chicago, entre os dias 18 e 21 de março.  Nesse estudo, os pesquisadores investigaram o potencial impacto na saúde a longo prazo de seguir um plano alimentar com janela de 8 horas de alimentação.

Os pesquisadores revisaram informações sobre padrões alimentares de participantes das National Health and Nutrition Examination Surveys (NHANES) anuais de 2003-2018 em comparação com dados sobre pessoas que morreram nos EUA, de 2003 a dezembro de 2019. Todos eles preencheram dois questionários de recordação dietética de 24 horas no primeiro ano de inscrição. As mortes até o final de 2019 foram determinadas através do índice nacional de mortalidade.

Durante um acompanhamento médio de 8 anos, houve 2797 mortes por qualquer causa, incluindo 840 mortes por doenças cardiovasculares (DCV) e 643 mortes por câncer. Na amostra geral, em comparação com uma duração alimentar de 12-16 horas, jejum intermitente com janela alimentar de 8 horas foi significativamente associado a um risco aumentado de mortalidade cardiovascular (razão de risco [HR], 1,91; IC 95%, 1,20-3,03).

Mas, por que não devemos assumir então que o jejum intermitente aumenta o risco de morte CV? A pesquisa ainda não foi publicada em um periódico revisado por pares – trata-se apenas de um pôster – e possui muitas limitações, como por exemplo:

  • O estudo foi observacional;
  • Os pesquisadores não tinham informações sobre a qualidade da dieta dos participantes do estudo, limitação importantíssima!! Por exemplo, se na sua janela alimentar o participante ingeria grande quantidade de alimentos ricos em gordura saturada, sal e açúcar, isso poderia explicar seu maior risco CV.
  • As pessoas podem ter praticado jejum intermitente porque trabalhavam em turnos ou tinham horários de sono irregulares, que são fatores de risco cardiovasculares independentes;
  • Os questionários dietéticos utilizados são, de modo geral, pouco confiáveis;
  • Há possíveis fatores de confusão, como o tabagismo no grupo que apresentou maior risco de mortalidade.

Qual é a nossa conclusão?

Trata-se de uma pesquisa preliminar, que sequer teve sua metodologia e resultados revisados e não foi publicada. O resultado é frágil e encontrado num contexto de inúmeras limitações. Importante deixar claro que esta não é uma defesa do jejum intermitente, isso seria tema para outro texto, mas as últimas manchetes são um exagero midiático a respeito de um tema popular.

 



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Sobre o autor

Ícaro Sampaio

Graduação em medicina pela Universidade Federal do Vale do São Francisco
Residência em Clínica Médica pelo Hospital Regional de Juazeiro - BA
Residência em Endocrinologia e Metabologia pelo Hospital das Clínicas da UFPE
Título de Especialista pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia
Editor e Professor do AfyaEndocrinopapers
Professor de endocrinologia da Medcel
Médico Endocrinologista no Hospital Esperança Recife

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